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sábado, 12 de novembro de 2011

Um olhar sobre o Desconhecido

Gostar de Lisboa não significa necessariamente andar sempre a entoar elogios à cidade. Aliás basta andar pelas suas ruas para ouvir os lisboetas, os que não a conseguem abandonar, a queixarem-se de tudo: das obras, dos transportes, da câmara, enfim de tudo e de nada. E se tivermos mais atenção, ainda reparamos que são os lisboetas mais velhos, os que aqui vivem há décadas, que mais queixumes têm.

Por isso, o meu plano para hoje era aproveitar este espaço para dar a Lisboa um bocadinho desse amor duro, um ralhete como os que se dá a quem se gosta quando nos desilude, quando faz uma asneira que vai contra aquilo que queremos e gostamos que seja. O meu plano era traduzir para português o ranger de dentes, a fúria destilada sempre que passo pelo Centro Champalimaud para o Desconhecido, um edifício desproporcionado erigido recentemente à beira do Tejo, em Algés.


E já tinha tudo previsto. Ia fazer pouco da tacanhez de quem optou por colocar o nome daquilo em inglês e da sua pretensão sobranceira de querer anunciar que ali se iria desvendar o desconhecido.


Ia queixar-me da idiotice que é ter mesmo ao lado o conjunto de edifícios da Doca Pesca completamente devolutos e apesar disso optar por construir de novo e em dimensões brutais, não só em altura mas também em volume; tão brutais que foi preciso aterrar parte do rio para o fazer. E de, por estar também muito perto da Torre de Belém, a ensombrar com o seu gigantismo, tirando-lhe o protagonismo conquistado há séculos na recepção aos forasteiros que chegam a Lisboa pelo mar.

E não me queria esquecer de elogiar a sua engenhosa concepção arquitectónica, porque disso gostei. Gostei da opção pela pedra branca que cobre todo o conjunto, do tubo aéreo que liga os dois edifícios e paira sobre um páteo aladeirado que culmina num par de postes gigantescos. Atrás destes descobre-se um espelho de água em socalco, para nos dar a ilusão de que se funde com o mar. Sem me alongar demasiado para descrever pormenores como o anfiteatro exterior virado para o rio, as janelas elípticas ou o jardim interior, limito-me a afirmar que é uma criação notável pelo excelente aproveitamento do espaço onde foi implantado, pela forma como se relaciona com a água e com o sol.


  

Ou seja, não é o edifício em si que me incomoda, é o sítio onde foi posto. Afinal, pode-se investigar o desconhecido em qualquer outra parte onde não se fizesse sombra à Torre, não tapasse o rio ou desse vida a tantos e tantos edfícios moribundos que estão por aí.


Estas eram ou melhor, foram as minhas certezas, até as partilhar à mesa do café (por falar em café no Darwin's, o restaurante do Centro, cobraram-me 2,50 € por uma bica!) com alguém que me explicou que ali não se faz somente investigação. Também se tratam doentes de oncologia, uma das principais áreas de pesquisa. É que ela tinha visto numa reportagem as condições em que é feita a quimioterapia - em quartos individuais, virados para o mar - e ela, que passou por isso em enfermarias partilhadas com muitos doentes, sabe valorizar a importância disso num dos tratamentos mais agressivos que existem.

Não sei bem se isso compensa os estragos de que falei mas, se ajudar alguém a ultrapassar o verdadeiro calvário que é a quimioterapia, vou pelo menos deixar de rezingar cada vez que passar por ali.



      

2 comentários:

  1. Ainda não conheço esse centro, pelo que não posso ter uma opinião vinculada.
    Mas analisando a sua indignação (e a dos outros lisboetas) com proximidade com a Torre de Belém, vem-me à memória um caso pior: O Centro Cultural de Belém. Um edifício lado a lado com dois ícones de Portugal, a Torre e o Mosteiro. Não será esse um caso mais flagrante do desrespeito por monumentos históricos?

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  2. Talvez este seja daqueles casos em que o bem que faz compense o mal que parece. Não sei. Quanto ao CCB a Susana já escreveu e ilustrou a sua opinião. Dê uma espreitadela: http://turistaemcasa.blogspot.com/2011/03/esta-se-bem-em-belem.html
    Obrigado pela vista. Um abraço,

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