O Bugio é um dos monumentos mais enigmáticos de Lisboa. Omnipresente e ignorado é, por isso mesmo, um dos que sempre me suscitou a curiosidade, ampliada pela distância a que está da costa que não deixa perceber o seu real tamanho, a sua forma, a sua função. A razão de existir.
Há dias tive a oportunidade de satisfazer essa curiosidade.
Sob um céu azul fabuloso (tão singular que devia ter um nome próprio, talvez Azul-Lisboa) fizemo-nos ao mar a bordo do semi-rígido que em cinco emocionantes minutos nos levou até perto do Bugio. A entrada para o forte faz-se por uma pequena porta que nos leva ao primeiro nível do edifício, uma base larga de pedra branca sobre a qual assenta a muralha interior, o verdadeiro forte.
Pela porta da muralha interior acede-se a uma pequena câmara onde se começa a suspeitar do abandono a que tem estado condenado o forte do Bugio. O seu interior tem várias dependências, espaços destinados à guarnição militar, aos víveres, ao azeite (o combustível que se usava), à oração – o estado a que se deixou chegar a pequena capela é confrangedor - e, mais tarde, aos alojamentos dos faroleiros e suas famílias. Uns pequenos tê-zero duplex, um dos quais com o privilégio de uma fabulosa vista de mar.
No centro da circunferência formada pela muralha está a cisterna para a água potável, o bem mais precioso para a guarnição por ser o mais difícil de transportar. A cisterna é a base da torre do farol, ligada à muralha por quatro arcos que lhe auxiliam o equilíbrio e, no piso superior (o topo das muralhas), permitem o acesso ao farol propriamente dito.
É um edifício fascinante. Uma nau de pedra erigida para defender a barra das armadas inimigas, construída para albergar os canhões que cruzariam o seu tiro com as fortificações da linha de Cascais. Uma fortaleza inexpugnável que da única vez em que foi posta à prova falhou rotundamente o teste a demonstrar a honrosa inépcia deste povo para as artes da guerra.
A minha oportunidade de o conhecer – e de ouvir as suas estórias – foi-me dada pela Associação Espaço e Memória e por Joaquim Boiça, filho de um dos últimos faroleiros do Bugio e historiador apaixonado pela sua terra, pela arquitectura militar e pelo farol que conheceu quando aqui havia vida. Uma vida que ficou suspensa neste (mais um) sítio que está deixado ao abandono e que podia, como poucos outros, contar as histórias do século de ouro português. Não o faz porque as autoridades que o superintendem não se entendem, mantendo essa história ao largo das pessoas que as querem conhecer.
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